SINOPSE: As estórias são conhecidas de todos: sapatinhos de cristal, maçãs envenenadas, príncipes encantados e lobos maus; e todos sabem que, no fim, os que mereciam viveram felizes para sempre.
Então porque é que isso não aconteceu? Porque é que o mundo parece virado do avesso? E porque é que toda a gente age como se nada fosse? São essas as perguntas que atormentam Borralheiro, um dos poucos que sentem que algo de profundamente errado se passou, e o único que se predispõe a ir em busca de respostas. Respostas essas que lhe chegam às mãos na forma dos versos crípticos do misterioso Perraultimato, que o lança numa demanda em busca da verdadeira essência das estórias.
Acompanhado por quatro outras figuras do imaginário popular europeu —a imprevisível Capuchinho, o enigmático Aprendiz, a atormentada Vasilisa e o perigoso Burra — Borralheiro embarca numa inesquecível aventura neste primeiro volume da distopia folclórica Felizes Viveram Uma Vez.
OPINIÃO: Há histórias que parecem existir desde sempre. Quem nunca ouviu falar da Capuchinho Vermelho, de reis que fazem promessas daquilo que desconhecem ter, de heróis que derrotam o mal e, no fim, vivem felizes para sempre...
Estas estórias nem sempre foram assim. Na sua criação, elas serviam para passar mensagens de moral, através de finais macabros e, revivendo o espírito dos célebres irmãos Grimm (entre outros antigos prosadores de contos), este escritor português agarra nas personagens, que todos conhecemos, e dá-lhes um toque perverso.
Algo aconteceu nas histórias e nada está a terminar bem. Desde o início (onde há a introdução da história das personagens), vemos os finais adulterados. Onde está o "felizes para sempre"? Como é que a cantoria de felicidade, após a tormenta, se transformou em banhos de sangue e confianças traídas?
É neste panorama que Filipe Faria insere uma irreverente e sanguinária capuchinho; um corajoso Borralheiro, que acredita que "qualquer coisa" não está a bater certo; um Aprendiz de mago, que vive rodeado de espíritos que invoca e controla; um Mama-na-burra, desacreditado na bondade do sexo feminino e, por fim, uma Vassilisa, que espalha a morte por onde passa.
Foi o primeiro livro que li de "recontos" e posso dizer que fiquei rendida à temática. Usar um universo, que todos conhecemos, e transformá-lo em algo cruel e, sobretudo, moldável, é simplesmente delicioso.
Quanto à escrita de Filipe, o autor escreve com confiança e denota-se um uso elevado do léxico. As frases são tipicamente portuguesas, grandes e carregadas de vírgulas; o que neste livro assenta bastante bem, tendo em conta a natureza da narrativa. É de leitura compulsiva, mas termina com aquela sensação de "soube a pouco", uma vez que é o primeiro de mais.
Recomendo vivamente esta obra portuguesa, que tão bem se evidencia entre os demais, que exploram o mundo das lendas e dos contos tradicionais, trazendo-os de volta à vida.
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